OS PRIMEIROS PASSOS DAS IRMÃS SERVAS DE MARIA REPARADORAS
O bispo e os fiéis perceberam a grande necessidade de atingir as famílias, abrir escolas, fazer algo pelo povo. Animado, dom Próspero Bernardi escreveu para frei Albarelli pedindo que fizesse um apelo às Congregações, pedindo irmãs para o trabalho no Acre. Frei Albarelli logo escreveu para Madre Elisa Andreoli, fundadora das Irmãs Servas de Maria Reparadoras. Esta, à sua vez, consultou às irmãs e elas responderam positivamente para a missionariedade.
“Dom Próspero pede que as irmãs enviadas sejam irmãs sadias de mente e de corpo, dispostas. Exorta ainda que além da bagagem pessoal, é necessário trazer todos os utensílios de casa, do quarto, da cozinha, refeitório, capela. Não necessita trazer cama, mesa, cadeira. De início, as coisas seriam guardadas em caixas; pediu muito cuidado com as coisas de viagem e que peçam ao Anjo da Guarda para protegê-las, porque podem cair em mãos de ladrões. Lembra que tragam papel para cartas, pois o papel é muito caro”.
Esta Congregação era formada canonicamente desde o ano 1881, e desde o começo procurou se ligar à espiritualidade da Ordem dos Servos de Maria com a devoção a Nossa Senhora das Dores. O carisma das irmãs, desde o ano 1911, foi se esclarecendo pela obra de reparação que assumiram na cidade de Rovigo diante da imagem de Nossa Senhora das Dores. Só a partir daí as irmãs da Ordem Terceira dos Servos de Maria, adquiriram a atual denominação.
"Elas, além da comunhão quotidiana, fazem cada dia, a turno, uma hora de oração reparadora e procuram espalhar a Ordem Terceira dos Servos de Maria e a prática da reparação... Assim o lema deste Instituto é: Meditar as dores de Maria Santíssima, imitar as excelsas virtudes e reparar as tantas ofensas que ela recebe".
Esta Congregação feminina nasceu, portanto, na nova visão teológica daquele período, marcada pela reação antiliberal por parte dos católicos. O Papado acabava de perder o Estado Pontifício em 1870 e na Igreja se difundia um sentimento de pessimismo e de derrota. De outro lado, o movimento operário que ia se organizando através do socialismo contribuiu a criar uma interpretação da história como se fosse controlada pelos poderes do mal.
Criou-se, portanto, um clima favorável a uma devoção reparadora, como a do Sagrado Coração de Jesus, através da associação "Apostolado da Oração", e
como a de Nossa Senhora das Dores, através das obras de Ordens Terceiras e Congregações religiosas.
Os religiosos chegados ao Acre, faziam questão de consagrar cada seringal a Nossa Senhora das Dores, deixando no barracão a imagem dela e a
dos Sete Santos Fundadores. Esta espiritualidade era de fato muito bem recebida pela hierarquia brasileira, e pelo povo também, por causa do sofrimento do santo ao qual o povo podia se identificar. Na visão da hierarquia, porém, o enfoque era a reparação, em última analise para com a Igreja, que se sentia marginalizada e perseguida pelos tempos modernos.
Quando, em 1921, Dom Próspero convidou Madre Elisa Andreoli, a fundadora da Congregação, a assumir o compromisso missionário no Acre, houve respostas numerosas e entusiasmadas.
Na vida da Congregação este acontecimento se revestiu de grande importância, pois demonstrou sua sensibilidade para o serviço missionário, confirmou sua disponibilidade para pro ostas novas de serviço apostólico e permitiu que a Congregação se abrisse para maiores experiências eclesiais. “Desta maneira toma lugar na história o gesto corajoso e carregado de fé de Madre Elisa, um gesto missionário. Através de suas irmãs, ela começa a ser uma presença-serviço aqui no Brasil, a partir de um povo distante e esquecido, o povo acriano”.
A Congregação estava em franca expansão na Itália e surpreendeu o fato da prontidão com que a Madre Elisa colocou a disposição suas religiosas para uma missão recém-iniciada. O número das freiras que aceitaram a proposta missionária foi muito grande. Eis como a mesma Madre Elisa escrevia: "Revmo. Padre Geral: Estou certa de que já é de seu conhecimento minha resposta ao Revmo. Padre Albarelli, Provincial, no sentido de que estou pronta a mandar algumas Irmãs em ajuda a S. Ex. Revma. Mons. Bernardi. Isto desejo repetir também a V.Revma. E ao mesmo tempo agradecer pela deferência com que nos distingue. Sinto-me, porém, no dever de expor-lhe, Revmo. Padre, com filial confidência, que nos achamos impossibilitadas de poder arcar com as despesas de viagem e alimentação. Devo dizer-lhe que minhas Irmãs estão animadas de grande espírito de sacrifício e cheias de boa vontade para a prática do bem, confiando em Deus; porém, elas não compreendem nenhuma palavra estrangeira, tornando-se necessário, em consequência, que durante a viagem estejam acompanhadas por uma pessoa devidamente designada por V. Revma. Renovando-lhe meus mais cordiais agradecimentos, desejo assegurar a filial devoção de toda a comunidade a V. Revma. e a constante união à Santa Ordem dos Servos. Humildemente prostrada, rogo-lhe abençoar-me e a todas as minhas filhas.
Da P.V. Revma. In corde Jesu et Mariae. Dev.ma filha. Soror M. Elisa Andreoli. Superiora Geral das fevereiro de 1921”.
“Agradecida a Nossa Senhora, Madre Elisa escolheu seis das Irmãs que se dispuseram para esta missão e chamou-as em Adria para uma preparação. Fazia isto sem perda de tempo e do melhor modo possível: oração, estudo, providenciar o enxoval para a missão e os documentos necessários para a viagem.
Finalmente foi realizada a cerimônia de entrega do crucifixo às missionárias, numa comovente função na igreja de Tomba em Adria, presidida pelo vigário da paróquia, padre Cornélio. O povo participou e muitos foram se despedir delas. No dia seguinte à celebração desta festa, pode-se dizer, Madre Elisa acompanhou-as ao noviciado em Rovigo. Madre Dolores, além de presenteá-las com objetos religiosos de piedade mariana, ecomendou-lhes a reparação.
Às quinze horas, partiram todas alegres e ‘beatas’, enquanto as noviças as admiravam”.
As primeiras irmãs Servas de Maria Reparadoras, da Congregação de Adria, chegadas a Sena Madureira foram: Ir. Maria Constantina Gian, Ir. Mercedes Andreolli, Ir. Margarida Damietto, Ir. Rosário Vettorato, Ir. Ester Bressan, e a noviça Augusta Franceschi, a futura Ir. Peregrina. “O cálculo da viagem da Itália ao Amazonas foi em torno de sete mil libras, por cabeça Comenta-se que lhes roubaram uma caixa”.
Demoraram em Manaus, hospedadas pelas irmãs Filhas de Santa Ana, muitas delas italianas também, que deram aulas de português às irmãs recém- chegadas. Elas escreviam assim para a Superiora: "Minha boa Madre, para falar a verdade estas paradas não foram muito agradáveis para a gente e para a nossa saúde... Porém, isso foi até uma graça, pois tivemos a oportunidade de ver os bons trabalhos e os métodos das freiras daqui, sobre educação e hospitais, assim podemos ter um pouco de prática".
“Neste tempo, as primeiras missionárias aproveitaram para aprender português. Nos documentos, existe um comentário de que as Irmãs chamaram a atenção do povo pela cor rosada do rosto, eles (o povo manauense) pensando que fosse maquiagem, quando falaram ao senhor bispo dizendo: ‘Chegaram as irmãs pintadas’. O bispo averiguou que eram rosadas da natureza. Este fato repete até nossos dias quando chegam novas irmãs italianas na região, de pele bela e colorida”.
Assim, no dia 21 de Novembro de 1921, “O Bispo Prelado aceita as Irmãs Servas de Maria Reparadoras erigindo canonicamente sua casa, declarada também Casa de Noviciado, debaixo de sua imediata jurisdição e seus sucessores. Confirma no que lhe diz respeito às Constituições do Instituto, mandando em virtude de Santa Obediência a todos os membros de dita Casa Religiosa e exata observação”.
E, assim, uma vez chegadas a Sena Madureira, o bispo escreveu à Madre Geral Elisa Andreoli, dia 15 de Novembro de 1921: “Suas filhas espirituais, chegadas ontem, nos deixaram boa impressão durante a permanência temporária em Manaus e estou certo que, uma vez aqui, essa impressão será ainda maior por ser mais vasto o campo de suas atividades... Ontem recém- chegadas, foram assistir a Santa Missa, depois acompanhadas pelas autoridades e pelo povo foram conduzidas à modesta casa que as abrigava. Hoje, antes de se estabelecerem completamente, me fizeram a entrega de um presente enviado pela Superiora Geral... Uma cópia das Constituições do Instituto, um talher, um porta-toalhas e uma pena para escrever”. Para Madre M. Elisa, as irmãs cumpriam sua antiga aspiração. Confidenciava às irmãs missionárias de Sena Madureira: “Quando eu era jovem noviça em outro Instituto, pedia as Missões; foi-me sempre negado por causa da saúde, etc. Pensai que vós me representais e traduzis a vocação de vossa indigna madre geral, que vós dizeis de amá-la tanto”.